Sobre o UTSM

Pelo terceiro ano consegui apresentar-me na partida do UTSM, com confiança para acabar a prova, mesmo sabendo da falta de preparação. Na verdade nunca me apresentei com tão poucos treinos e quilómetros corridos para um prova. A corrida tinha que ser muito bem gerida, sei que 90% é psicológico, mas os outros 10% tinham sido muito mal preparados. A minha fé estava toda nestes 90%.

Comecei a prova com calma, tinha previsto que devido a estes handicaps todos o meu tempo final ira rondar as 20h30, ou seja, seguramente mais 5 horas que os tempos que fiz nos anos anteriores. 
Primeiro objectivo: chegar a Alegrete para o renovar de forças e ter aquela ajuda extra para subir S. Mamede. Cheguei a Alegrete poucos minutos depois do tempo previsto, o congestionamento que se verificou nos quilómetros iniciais eram a causa deste pequeno atraso, de qualquer maneira a situação estava controlada. 
Segundo objectivo: Antenas, conquistadas. Algum frio e pessoal que não estava preparado para isso... (mas não havia um corta vento no material obrigatório?) Muito pessoal a ficar por aqui, as subidas eram duras, mas acho que a principal dificuldade era o pó que estava no ar, ultrapassei este obstáculo cobrindo a boca com uma bandana. Este ano a confusão era muita no alto da serra, muitos atletas numa tenda muito pequena para tanta gente. Lá me fiz novamente aos trilhos depois de ter abastecido, a saída das antenas não foi, como nos anos anteriores, pelo single track, foi por um percurso algo mais simples tecnicamente, mas a correr ou a progredir como podia lá continuei com as pernas a querer ficar por ali mas a mente focada no grande objectivo não lhes deu qualquer hipótese, ignorando o que elas diziam. 
Terceiro objectivo: Ataque ao Castelo. E como um companheiro bom observador que pelo sentido da nossa corrida pensou que íamos atacar o touro de frente... como já sabia o que me esperava corrigi-o: vamos atacar o touro de frente duas vezes... Mais tarde, naquela descida da qual desconfiamos a primeira vez: "o castelo está para ali e nós vamos descer para ali?", o tal companheiro, já tinha percebido o que eu queria dizer com atacar o toiro de frente duas vezes... Subi e entrei no castelo, cheguei ao abastecimento e procurei o meu saco, retirei os pacotes de mel e enchi uma garrafa com quase meio litro de bebida com electrólitos. Comi e lá fui novamente calçada romana abaixo. Uma nota que sempre me vem à cabeça cada vez que ali passo: os romanos podiam fazer muita coisa bem feita, mas calçada não era uma delas... 
Sigo para o quarto objectivo. (Ok, a partir daqui deixa de haver objectivos específicos, o objectivo é continuar a meter um pé à frente de outro em direcção à meta. Mas tinha o grande objectivo de chegar o mais rápido possível junto à Ana. Curioso, o meu grande objectivo não era acabar a prova, isso seria secundário...) Mas o quarto objectivo era chegar à Penha de Castelo de Vide, pelo caminho fomos brutalmente atacados pelo sol e pelo calor, com os pés a doerem por estarem-se a formar bolhas na planta deles, a corrida começou a ser mais dolorosa. Mas um homem com uma missão é difícil de derrubar, "um homem pode ser destruído mas não derrotado" como disse uma vez o velho Santiago de dentro do seu esquife, lá continuei e lá cheguei à Penha de Castelo de Vide. Desci a corda, abanquei no PAC e telefonei à ANA: Não vou chegar no tempo previsto ao PAC9, vou atrasar-me. Veio ter comigo, depois de já ter feito o caminho do PAC8 ao PAC9, achou que voltar para trás ao meu encontro seria uma boa solução. De Castelo de Vide ao Convento de Provença a coisa foi penosa, aqueles 10% de falta de preparação fizeram-se sentir. O calor apertou, a dor nos pés aumentou, os níveis de concentração desceram e... perdi-me. Segui sempre pelo percurso dos anos anteriores, sem notar que era preciso sair do estradão à esquerda. A coisa ficou pelos 25 a 30 minutos, entre 10 a 15 minutos a andar até me aperceber que não havia fitas, e depois mais 10 a 15 minutos a andar "pra trás". Pelo caminho de volta ao caminho correcto ainda perguntei ao companheiro José Carlos Melo, que vinha na minha direcção pelas fitas... também não as via, ia perdido pelo mesmo sítio... 
Retomei o trilho certo. Corri conforme podia, reparei que me tinha esquecido de passar protector solar na cara, tentei proteger o mais possível do sol, e passado algum tempo, já depois do abastecimento intermédio, eis que consigo chegar (surgiu-me "como uma suave aparição") o meu grande objectivo. Passado mais de 16 horas de ter partido, com quase 90 quilómetros percorridos, reencontro a Ana (o reencontro foi passado uns 70 quilómetros e 14 horas depois de Alegrete...). A partir daqui tudo foi mais descontraído, já não havia ninguém pelo caminho à minha espera que me fizesse sentir culpado por estar a demorar tanto tempo. As outras pessoas lindas que estavam à minha espera, não se importariam de ter de passar mais uma horita na piscina... 
Seguimos os dois, ora a conversar ora a correr ora a caminhar e chegamos muito lentamente ao convento da Provença. Aqui abanquei com mais força e mais vontade ainda e vi o estado dos meus pés: duas enormes bolhas, uma em cada pé. Experimentei a sensação de alivio que foi tirar os pés das sapatilhas e das meias, e deixei-me estar por bastante tempo. Passaram bastantes companheiros, mas eu como não tinha pressa fui ficando. Na verdade estava um pouco enjoado e não comi muito com medo de vomitar tudo de seguida. A Otília chegou e partiu e eu fiquei mais um tempo. Depois também eu lá resolvi calçar de novo as meias e as sapatilhas e voltar à estrada, não sei porque razão não rebentei as bolhas, pelo que a dor nos pés continuou, mas um copo de coca-cola fresca que tinha bebido quando sai do PAC renovou-me o sistema e deixei de ter a sensação de enjoo. Rapidamente chegamos à Sra da Penha, e sentamos no cimo das escadas que teríamos de descer a conversar e a ver a paisagem. Descemos, faltam 5km, continuamos, falta 4km, nesta altura desistir já não é opção, na verdade nunca passou pelo espírito, faltam 3km, a Ana para: no meio do caminho, enterrada no pó a Ana consegue ver uma pequena tartaruga (ou cágado). Apanhou, deitamos água por cima, não há nenhum tanque perto, nada que indique porque raio aquela tartaruga foi ali parar, se a deixar-mos ali ela não vai sobreviver, pelo que tomamos (eu não sei se tinha alguma alternativa) a decisão de a trazer connosco. Nome de código para a misteriosa tartaruga: Poeira, Ultra Poeira. 
Falta 1 Km, parabéns! Aqui já vamos com saudades da corrida que ficou para trás. Um último esforço: saltar um balaústre, que parecendo que não, mas depois de 100km é algo extraordinariamente desmedido, qualquer obstáculo depois de 100km é monstruoso. 
Chegada à meta, o pedido aceite para cruzar comigo todas as metas.
Gostei de voltar a Portalegre, os anos anteriores foi mais acolhedor, mas o resultado deste aumento de atletas é o resultado disso: a boa qualidade transmitida pelos participantes faz boa publicidade. Não fui ao coreto de Alegrete e tive pena disso. A intenção é voltar para o ano com uma melhor preparação. Vamos a ver se consigo, não é fácil...

Comentários

  1. Parabéns companheiro, depois de uns aninhos disto a parte psicológica faz toda a diferença.
    Este ano optei por não ir, gostava de voltar para o ano mas é como disses não é fácil, vamos ver.
    Beijinhos para a Ana.
    Aguenta-te Sempre.

    Abraço Grande,
    António Almeida

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    Respostas
    1. A ausência foi notada pela nossa parte.
      A maior dificuldade é mesmo o estar presente na partida...
      Abraço.

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  2. PS: Há aqui uma incorrecção, ou melhor, há uma correcção a fazer: Eu tinha previsto demorar 19h30 e não as 20h30 que falei no começo do post. O que aconteceu é que na realidade demorei as 20h30.

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